Uma cidade não é uma empresa
ANTÔNIO DE FARIA LOPES
Advogado
A burocracia, cada vez mais exigente e atrasada, engessa a administração pública e alimenta o desejo de rapidez nas decisões e eficiência no fazer, o que facilita a propaganda dos que defendem a transformação das cidades em empresas. A corrupção, já uma endemia, é outro fator favorável à mudança de foco das eleições e da política. Os profissionais da política vão perdendo credibilidade pelo discurso vazio e, principalmente, pelos seus atos. A maioria deles pensa apenas na próxima eleição e nos aliados que vai conquistar para obter votos e financiar suas campanhas cada vez mais dispendiosas.
Começa por aí a "aliança" dos profissionais da política com os do lucro. Os que entram com o financiamento vencem as licitações, os que aparentemente estão no poder recebem sua comissão e o compromisso de que tudo se repita na eleição seguinte. Os partidos, que são indispensáveis para que tudo pareça legal e correto, coligam-se para ter mais tempo de propaganda na televisão, ocupar fraternalmente os espaços de poder e garantir a "governabilidade". Os marqueteiros preparam a propaganda depois de pesquisarem o que o povo quer ouvir e editam um caderno chamado "programa de governo" que nem os candidatos leem.
E o povo? Onde fica quem é, pelo menos, na definição de democracia, o dono do poder? Vamos nos acostumando e aceitando tudo o que decidem por nós. Como no poema de Eduardo Alves Costa (atribuído erradamente a Brecht), vai chegar o dia que "o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada".
Belo Horizonte é o exemplo mais ilustrativo de como o povo foi posto para escanteio. As articulações são todas de cúpula. Nenhum problema da cidade é discutido. O que importa é a manutenção do poder por forças falsamente opostas e cujos interesses são comuns. A especulação imobiliária, o desprezo pelo meio ambiente, a insegurança crescente, as obras todas voltadas para uma efeméride - a Copa do Mundo - da qual o belo-horizontino estará ausente. Ou será que nos interessa a construção de hotéis que antecipam o fim da Pampulha? Um mês de festas para os empresários, inclusive os do futebol. Nem se lembram de que Belo Horizonte é uma cidade.
Fonte: O TEMPO
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