segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Empresas pagam menos de R$ 1 por dia para sujar BH com outdoor

Valor pago à Prefeitura de BH para compensar impacto negativo de cada outdoor não supera R$ 300 por ano na maioria dos casos, o que gera críticas entre entidades como Crea e IAB. Empresários sustentam que lances estão acima do mínimo estabelecido por decreto




Flávia Ayer
Outdoors instalados na Avenida Cristiano Machado: para entidades como o Crea e o IAB, valores repassados por empresas de outdoor à prefeitura são baixos e não compensam o impacto no visual da cidade


Menos de R$ 1 por dia é quanto a maioria dos empresários do ramo de outdoors paga à Prefeitura de Belo Horizonte pelo dano à paisagem ao instalar uma placa publicitária na capital. Levantamento feito pelo Estado de Minas mostra que a arrecadação referente à “taxa” de impacto dos engenhos, mecanismo criado em 2010 como forma de compensar a poluição visual, não passou de R$ 300 por peça em 82% dos casos. A receita este ano foi de R$ 21.234, insuficiente para comprar um carro popular. Os números abrem entre especialistas a discussão sobre se vale a pena permitir a instalação de placas com esses valores pagos ao município. 

A guerra deflagrada pela prefeitura contra os engenhos de publicidade começou em 2010, quando alterações no Código de Posturas reduziram em 85% os espaços para a instalação das placas no município, caindo de 1,5 mil regulares para 247 placas, atualmente. A partir de chamamentos públicos, o Executivo criou uma forma de organizar a oferta dos locais autorizados. Ao mesmo tempo, estabeleceu um mecanismo frente à “necessidade de compensação da poluição da paisagem urbana gerada pela instalação do engenho de publicidade”, segundo descreve o Decreto 14.060/2010. De acordo com a regulamentação, os recursos arrecadados deveriam ser destinados a ações para suavizar o impacto negativo das placas publicitárias.

Como num leilão, interessados em conquistar o ponto para instalar o engenho, ainda que em terreno particular, oferecem um pagamento ao poder público. Ganha a empresa que der o maior preço – o lance mínimo é R$ 136. Os chamamentos começaram em 2011 e, desde então, somam 283 processos. O EM analisou 83 chamamentos das nove regionais nos quais os preços foram discriminados, o equivalente a um terço dos procedimentos. A constatação é de que o preço pago pelas empresas por placa gira em torno dos R$ 300 em 68 casos, o que corresponde a 82% do total pesquisado. Em mais da metade dos chamamentos (56%), o valor máximo é de R$ 200.

“O preço não vale o impacto”, avalia a presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) em Minas Gerais, Rose Guedes. A entidade defende a proibição dos outdoors na capital, seguindo exemplo de São Paulo, que baniu as placas publicitárias em 2007. “A nossa posição é retirar tudo. Essas placas tiram a visibilidade e a interface entre o cidadão e a cidade. Tem também a questão da segurança no trânsito, causando a distração de motoristas”, completa.

OFERTAS
Líder na abertura de chamamentos, a Regional Oeste, com avenidas cobiçadas pelo setor, como Raja Gabaglia e Barão Homem de Melo, conta com outdoors cujos donos pagaram R$ 130 pelo dano à paisagem, valor inferior ao lance mínimo anual. Fogem à regra engenhos de publicidade instalados na Regional Norte, endereço de avenidas como Cristiano Machado e Pedro I, que pagam R$ 1 mil pelo chamamento. O maior preço é de outdoor no Bairro Belvedere, na Região Centro-Sul, que teve a licença garantida depois de oferecer R$ 12 mil à prefeitura durante o chamamento.

Este ano, a prefeitura arrecadou R$ 21.234 com os procedimentos. “A quantia recebida pela compensação ao dano é irrisória. Esse valor mínimo estabelecido pela prefeitura é que iria estimular ou não uma ação”, opina o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG), Jobson Nogueira de Andrade. “Somos contrários a outdoors. Eles geram poluição visual, desatenção no trânsito, sensação de abandono e sujeira”, acrescenta Andrade.

O gerente de Normatização e Monitoramento da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana, Andres Campos, afirma que o lance mínimo foi definido a partir da soma dos preços públicos pagos para o licenciamento, de R$ 81,77 para análise e fornecimento da licença, além de R$ 54,50 para vistoria, num total de R$ 136,27 por ano. Também há uma Taxa de Fiscalização de Engenhos de Publicidade (TFEP), que varia de R$ 498 a cerca de R$ 3 mil por ano, dependendo do modelo. Mesmo antes dos chamamentos, essas cobranças já incidiam sobre os outdoors. “Não são preços altos diante da lucratividade que se tem com os engenhos de publicidade”, reconhece o gerente.

MERCADO
Atualmente, um anunciante paga em torno de R$ 1,2 mil a R$ 1,8 mil para estampar sua propaganda por duas semanas num outdoor simples. O preço pode aumentar se o anúncio é veiculado em painéis eletrônicos luminosos. O professor de arquitetura e urbanismo da UFMG Leonardo Barci Castriota avalia que o preço do chamamento não é de competência da prefeitura. “É uma questão de mercado”, diz.

O presidente do Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior no Estado de Minas Gerais (Sepex-MG), Cláudio Valadares, defende que os lances ofertados são, em sua maioria, 100% maiores que o mínimo exigido pela prefeitura. Ele também afirma que as benfeitorias feitas para que um outdoor seja instalado devem ser levadas em conta. “Não é só a taxa do chamamento, para pôr um engenho, há uma gama de benefícios como o terreno limpo, o passeio construído, além das taxas de fiscalização pagas”, enumera.

Segundo ele, somente agora o mercado está conseguindo se recuperar do baque sofrido com a mudança da lei. Várias empresas fecharam e, hoje, elas não passam de 25. “É hipocrisia falar que, numa cidade como Belo Horizonte, são os 200 outdoors que poluem a paisagem. É preciso combater outros problemas, como fiação elétrica aparente, pichação”, ressalta Valadares. “BH conseguiu casar a existência de um bom ambiente urbano sem proibir completamente”, diz.

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