Subtrair espaços à exclusão equivale, no Brasil, a estreitar o horizonte político do conservadorismo. E vice versa.
A
atordoante derrota de Serra em SP credencia a maior cidade do país, uma
das três maiores manchas urbanas do planeta, a se tornar uma gigantesca
referencia de políticas sociais emancipadoras, travadas até agora pela
blindagem tucana.
O golpe é superlativo; mais superlativas serão
as consequências se o PT agir com desassombro. Os derrotados sabem que
uma seta do tempo foi disparada no dia 28 de outubro de 2012; ela tem
potencial para traçar um novo divisor de ciclos na política brasileira.
Desdenhar
do feito de Lula é uma forma de acusar o golpe. Outra é tentar implodir
seu autor e o seu entorno.'Veja', os mervais, robertos freires e que
tais estão soltos na praça sem focinheira. Estão fazendo as duas coisas
ao mesmo tempo. E com o mesmo objetivo: querbrar a seta do tempo nesse
lusco-fusco histórico.
O êxito do Enem nesse momento, uma
semana depois da derrota maiúscula do PSDB em sua casa, não poderia
acontecer em hora mais ingrata.
O sucesso do Exame Nacional do
Ensino Medio representa um giro adicional no torniquete de dupla volta
que desde 2002 subtrai oxigênio social e político aos interesses
conservadores.
Compreensível o clima pesado excretado pelo dispositivo midiático.
Mais
uma vez ele se coloca na linha de frente quase solitária de uma direita
agressivamente gananciosa, mas incompetente para gerar agendas e
lideranças aglutinadoras. Serra era o seu delfim até ontem.
O Enem condensa um desmentido contundente das premissas que essa engrenagem sempre combateu.
Em primeiro lugar, atesta que existe política para pobre e política para rico neste país.
Ademais
de ilustrar a disjuntiva colocada em dúvida por Serra na sua campanha,
exemplifica como uma política pública pode mudar a relação de forças no
país.
A má vontade conservadora com o exame do ensino médio
poderia surpreender. O Enem foi criado no governo FHC, em 1998, para
medir a qualidade do ensino.
Mas foi com Lula, em 2009, que
adquiriu a dimensão de uma gigantesca alavanca social, ao se tornar
referência e mesmo alternativa ao vestibular de ingresso ao ensino
superior.
Este ano, 95% das universidades federais vão utilizar
em alguma medida as notas do exame para selecionar os alunos que
ocuparão as vagas de 2013.
Mas a nota no Enem serve ainda como
passaporte para ingresso no ProUni, bem como para o Fies, o Fundo de
Financiamento Estudantil, ademais de representar o passaporte de acesso
à política de Cotas.Em quatro anos, 50% das vagas nas instituições
federais serão destinadas a egressos das escolas públicas, com recorte
asociado, por renda e por raça.
Em 1997, no governo tucano,
apenas 4% dos estudantes matriculados nas universidades brasileiras eram
constituídos de jovens pretos e pardos. Hoje essa fatia saltou para
20%. E deve aumentar depressa.
Dos cerca de 5,7 milhões de
inscritos no Enem este ano, 2,42 milhões se declaram brancos; 2,4
milhões são pardos; 694 mil, pretos e 35 mil, indígenas.
A
educação superior no Brasil ainda é um dos sistemas de ensino mais
excludentes do mundo.Estão na universidade apenas 13% dos jovens na
faixa entre 18% e 24 anos.
Na América Latina, a média é superior a 30%;na Europa, EUA e Ásia é da ordem de 70%
Nos
anos 90, a justificativa tucana para a exclusão era de que a
prioridade deveria estar focada na educação básica, não em
universidades. Como se fosse possível ter bons professores nos ciclos
básicos sem ter um ensino superior de escala e qualidade compatíveis
para formá-los.
Sancionada a universidade para poucos, o funil
do vestibular fazia todo o sentido. Era o arremate de uma arquitetura
feita para excluir e não para incorporar.
O Enem reformulado no
governo Lula tornou-se a peça mais incomoda de subversão dessa lógica,
que reservava toda a universidade à cota exclusiva da elite.
É
por essas e outras que o êxito do exame nacional neste fim de semana
--recohecidamente bem formulado e sem fraude-- não poderia vir em pior
hora para os interesses abalados pela revés eleitoral em SP.
Fonte: AGÊNCIA CARTA MAIOR
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